Era uma vez, ou talvez fosse apenas uma vez mais, uma história que a gente escuta desde pequeno e que, de alguma maneira, nunca deixa de nos encantar. Os Reis Magos chegaram, como sempre, trazendo presentes. Um era de incenso, outro de mirra, o terceiro, de ouro. Tudo muito bonito, tudo muito simbólico, mas, no fundo, o que mais me impressiona é que, no meio de toda aquela pompa, no meio daquela majestade, ninguém se perguntou o que eles estavam realmente trazendo: um pouco de si mesmos, talvez?
Olho para essa história e fico pensando no trajeto, nos camelos, na longa viagem, com suas mil e uma paradas. Nada que se compare aos nossos pequenos percalços diários – um trânsito, as filas, um atraso, uma reunião que não acaba. Acontece que os Reis Magos tinham um caminho grande pela frente. O céu os guiava, e o deserto, com sua imensidão, parecia se curvar diante deles. Eles não estavam só entregando presentes; estavam trazendo uma parte deles, no fundo daquelas malas, no brilho de seus olhos cansados.
Lembro-me das vozinhas, que costumam contar, com sua voz suave, fininha de quem sabia tudo sobre a vida, uma história que não constava nos evangelhos. Não falava de ouro nem de mirra, mas de um presente mais simples: a baboucha. A baboucha era uma espécie de manta que ela usava no inverno, e que, de tão velha, parecia carregar todas as saudades de uma infância perdida em algum lugar distante. Era sua companhia nas noites mais geladas, o seu presente, mesmo que o mundo estivesse cheio de outros mais valiosos.
Me pergunto, agora, se não seria esse o presente mais bonito que um Rei Mago poderia trazer: algo simples e caloroso, que aquece não só o corpo, mas também a alma. Porque o que é o ouro, afinal, se não um peso nas mãos? E o incenso, que sobe e se perde no ar, não será ele, no fim das contas, apenas um cheiro fugaz? A mirra, com sua promessa de cura, ainda é uma cura que só o tempo pode testar.
A baboucha, na história da minha avó, era o que restava das coisas que não se podem comprar. Ela não tinha o brilho dourado da realeza, nem a fragrância exótica dos presentes raros. Era simples, mas tinha uma sabedoria que os Reis Magos talvez soubessem, sem saber: o presente mais importante que podemos dar não é o mais raro, mas o mais sincero.
No final das contas, os Reis Magos não são tão diferentes de nós. Estamos todos em uma jornada, cada um com sua bagagem, seus dons e suas limitações. Mas é curioso pensar que, entre tantos tesouros, o que realmente faz a diferença mais que os os presentes que se recebem, é o calor que podemos oferecer. A baboucha, afinal, era um presente para se dar, e não para se receber.
Quem sabe, no fundo, seja isso o que torna as coisas mais belas: a capacidade de dar algo que não podemos tocar, mas que aquece, de alguma forma, aqueles que estão ao nosso redor. Como a baboucha das avós, que, sem palavras, dizia tudo.