O VERDADEIRO NUNCA SE PERDE

Por Jornal Cidade de Agudos em 09/04/2025 às 09:57:02

Ela passou a vida inteira juntando. Moedas em latas de biscoito, cartas de amores antigos, fotografias de tempos que já não eram. Guardava também dores, os olhares que a feriram, os silêncios que gritaram mais alto que palavras. Acreditava que tudo era valioso, tudo devia ser lembrado. Até que um dia, sem aviso, a vida começou a esvaziá-la. Primeiro levou um anel, depois um livro querido, o viço do rosto, as forças das carnes e então, aos poucos, os rostos que ela amava começaram a sumir. Reclamou, chorou, se revoltou. Mas a vida, impassível, seguiu seu curso, tomando o que bem entendia.

No começo, foi como se a arrancassem dela mesma. O armário rareou, as gavetas ficaram vazias, a casa ecoava em silêncio. Mas algo curioso aconteceu: começou a sentir-se mais leve. Caminhava sem o peso das lembranças presas em objetos, respirava sem o sufoco daquilo que já não existia. A ausência tornou-se espaço, e no espaço, novas possibilidades se abriram. Descobriu que a saudade não precisa de fotografias, nem selfies, nem vídeos para existir e que amor verdadeiro nunca se perde, apenas muda de forma.

Foi então que compreendeu: a vida não estava tirando nada dela, estava libertando. Como a árvore que solta folhas no outono para renascer mais forte na primavera, como o pássaro que só aprende a voar quando deixa o ninho. Cada coisa que ia embora era um convite para ser mais leve, mais presente, mais viva. Sorriu. O que antes chamava de perda agora parecia leveza. Era a vida dizendo: vá, voe mais alto.

E ela voou. Sem as correntes do passado, sem o medo do que ainda viria. A cada dia, aprendeu a se despedir sem dor, a abraçar o que vem sem receio. Escolheu guardar apenas o que aquecia a alma: os sorrisos sinceros, as conversas que fizeram o tempo parar, o cheiro do café compartilhado com quem se ama. As memórias ruins, essas ela aprendeu a dissolver como tinta na água, deixando que se perdessem no esquecimento. Afinal, viver é escolher quais lembranças manter no coração e quais deixar que o vento leve. Porque tudo que realmente importa fica. Fica na pele, na memória, na alma.

Prazer, sou Vera Lúcia Ravagnani, eu conto histórias e ajudo pessoas a contarem suas próprias histórias em verso ou prosa por meio de cursos de escrita criativa e contoterapia.

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