O HOMEM É BOM OU MAU?

Por Jornal Cidade de Agudos em 10/04/2025 às 14:18:26

Talvez você já tenha ouvido falar na "teoria do bom selvagem": o homem nasce bom, mas a sociedade o perverte. Você concorda ou discorda dessa teoria? Rousseau, filósofo genebrino, foi o defensor dessa ideia de que era a sociedade a causadora do mal na personalidade do indivíduo. "Tout est bien sortant des mains de l´Auter des choses, tout dégénère entre les mains de l`homme". (ÉMILE ou De L´éducation, l. premier) Tudo é bom ao sair das mãos do Autor das coisas, tudo degenera nas mãos do homem, numa tradução livre. Verdade ou mentira? Vejamos.

É claro que a genética e a evolução biológica influem na nossa capacidade de bondade, de solidariedade, de compaixão. Por outro lado, a cultura à qual estamos expostos também influencia na nossa capacidade de diferir o certo do errado. Mas, veja bem, essa capacidade não se confunde com a capacidade de tomarmos as atitudes corretas ao invés das erradas. Uma coisa é saber o que deve ser feito, outra é agir de acordo com esse preceito. Para a dra. Ana Beatriz Silva, muitos "nascem com uma bagagem genética muito marcada". Para usar a expressão da cientista, alguns nascem com essa "desumanidade de fábrica". Felizmente, não são a maioria. Trata-se de uma verdade científica que muitos obtusamente se recusam a aceitar. Então, como explicar por que certos homens são invariavelmente transgressores? Se esse comportamento não pode ser atribuído simplesmente à má-criação, à educação ou à cultura de modo geral, qual sua origem? Parece que isso vem contrariar a teoria do "bom selvagem", concordando que não só a cultura como a genética podem propiciar ações boas e más.

Somos dotados não só do senso inato de moralidade, mas também de inteligência para análise estratégica. Podemos usar a razão para "tapear" a moral inata e tirar proveito de algumas situações. Os governos talvez sejam o exemplo mais cruel dessas habilidades. Para que o governante enfrente a opinião pública é preciso uma causa que seja aparentemente justa ou moral. Vejamos, por exemplo, pequeno caso da política brasileira atual. Ao realizar recentemente um périplo pela região asiática, o presidente, nessa crise que o país atravessa, levou uma comitiva de mais de cem pessoas, talvez para dar impressão de opulência aos países visitados, quando, na verdade, só queria distribuir benesses aos apaniguados. Despesas exageradas, gastos desmedidos poderiam ter sido evitados, mas, monta-se assim o cenário perfeito e moralmente maquiado. O que ocorre de fato, através desse e de outros atos sim ilares, é a execrável manipulação moral por parte de centenas de governantes, que através de ardis "driblam" o povo.

Ao longo da história, podemos observar incontáveis exemplos, ora legitimando as ações através da desqualificação étnica de determinados grupos humanos, como a perseguição dos judeus na Alemanha nazista, ora por motivos religiosos, como as ações terroristas da Al-Qaeda. O saber já foi um bem de alto valor moral social. Hoje, entretanto, vivemos na cultura do "ter" em que não importa o que uma pessoa saiba ou faça, mas sim que tenha posses, tenha dinheiro, de preferência muito, para pagar por suas falhas de caráter ou por sua ignorância.

Nesse cenário propício, surge ainda a cultura da "esperteza": temos de ser ricos, etiquetados, sarados, descolados e muito invejados. Não é preciso saber, o que importa é ter, é exibir todos os seus bens. É essa sociedade que faz com que, mesmo os bem-nascidos, optem por caminhos fáceis ou rápidos, como a venda de drogas ou produtos contrabandeados para obterem sucesso. O caminho do ser e do saber é longo e penoso demais. Rapazes e moças querem tudo aqui e agora.

Vivemos em uma cultura que privilegia o indivíduo em detrimento da humanidade. Basta ver o que está ocorrendo com a emissão de gazes tóxicos, causando o efeito estufa e o aquecimento global. Esses fatos, dentre outros, mostram como estamos com nossos valores equivocados e comprometendo nosso futuro como espécie. Temos o senso inato disso tudo e temos também inteligência para mudar o rumo de caminhos tortuosos. Precisamos, no entanto, propiciar novo tipo de cultura que se baseie no social e no sucesso do coletivo. Caso contrário, estaremos cada vez mais contaminando nossa supremacia biológica e propiciando brechas para voltar a andar de quatro...

Dra. Maria da Glória De Rosa
Pedagoga, Jornalista, Advogada
Profª. assistente doutora aposentada da UNESP
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