Quando você for ler um bom livro ou ouvir uma música excelente, procure um lugar sossegado como um canto de seu quarto ou mesmo de sua biblioteca. Um lugar discreto onde ninguém o incomode ou impeça de um bom mergulho no anonimato ou no desligamento das coisas mundanas. Não há nada melhor do que esse encontro com você mesmo.
Muitos críticos afirmam que a música, a pintura ou a literatura não significam nada exceto elas mesmas. Esses puristas querem nos dizer que elas não dizem nada sobre o destino humano ou sobre o universo em geral. Se esses puristas estão certos, então precisamos considerar esses músicos, pintores e artistas como monstros, como diz Aldous Huxley, porque é difícil que sejamos um ser humano e não expressemos visões sobre o mundo e sobre a vida.
Qualquer palavra ou expressão verbal para contextualizar uma obra de arte tentariam expressar o que o autor pretendeu dizer quando compôs a obra. Nossas próprias palavras, no entanto, são inadequadas para explicar o significado de outras palavras. Então, mais inadequadas elas serão quando tratamos de interpretar significados que tem sua expressão original em termos de literatura, pintura ou música.
O que diz, por exemplo, a música? Você poderá comprar um excerto sobre uma ópera, que lhe dará respostas exatas sobre seu conteúdo. Quer uma interpretação de a Nona Sinfonia de Beethoven? Sobre Hamlet? Sobre o Cubismo? Pode procurar que encontrará. Cada analista tem a sua versão. Você encontrará respostas exatas, cada uma com sua própria versão com respostas exatas. Exatas até demais, algumas chegando ao exagero. Esse é o problema.
O que é verdade para a pintura é igualmente verdade para a música. A música diz coisas sobre o mundo, mas em termos especificamente musicais. Qualquer tentativa de ir mais longe, de reproduzir essas expressões musicais com nossas próprias palavras estará necessariamente condenada ao fracasso. Não podemos isolar a verdade contida numa obra musical, mesmo numa tela de pintura ou num texto literário porque ela é, como diz Huxley, uma verdade-beleza. Quem estiver procurando a verdade deverá ser orientado para buscar os originais. Nossas próprias palavras não nos levarão muito longe.
É muito difícil encontrar um brasileiro que nunca tenha ouvido, sequer uma vez, a música "Tocando em frente", de Amir Sater e Ricardo Teixeira. Nela, a simplicidade do campo, a poesia, a musicalidade, e muito a filosofia e a sabedoria se misturam a uma mensagem. E já ouvimos centenas de interpretações dessa mensagem. A canção, lançada no início da década de 90, ultrapassou gerações e chegou até nós em um mundo carregado de chagas de uma pandemia que trouxe muito sofrimento, de guerras fratricidas, que testam a amargura e a insegurança dos homens.
Quando tocamos a música, somos transportados para o campo, fazendo refletir sobre o que realmente vale a pena, como somos pequenos diante da imensidão do universo. "Só levo a certeza de que muito pouco eu sei ou nada sei."
Levada pela vocação de querer interpretar o que só você sabe o que lhe toca o coração, é bem melhor o conselho: ouça a música, interprete-a você mesmo no silêncio do seu quarto. Somente a música e as letras conseguirão lhe dizer sobre a intenção dos autores quando afirmaram que "é preciso amor para poder pulsar, é preciso paz para poder sorrir."
Se quisermos saber é preciso ouvir.