O diretor e produtor Nilton Travesso se emocionou ao falar da morte do humorista e apresentador Jô Soares. Amigos de longa data, ele acompanhou o começo da carreira do artista na televisão. “A nossa amizade começou em 1959, depois de seis anos a fundação da TV Record e ele foi trazido pelo Silveira Sampaio, que era um grande ator, autor, apresentador, jornalista e médico. Ele foi a pessoa que descobriu Jô Soares”, contou o diretor em entrevista ao Jornal da Manhã. O humorista morava no Rio de Janeiro e veio a São Paulo para trabalhar com Nilton em um novo talk show que seria comandado por Silveira. “Ele roteirizava [o ‘SS Show’] junto com o João Evangelista Leão e eu dirigia. Entrava no ar meia-noite e terminava às 4h da manhã.” Jô gostou do trabalho e manifestou a Nilton seu desejo de se mudar para São Paulo, algo que aconteceu após o diretor conseguir um contrato para ele com a Record, em 1959, usando de argumento que Jô era “uma pessoa extremamente carinhosa, generosa, um big ator, um bom roteirista, um autor inacreditável e uma pessoa de qualidade profissional inacreditável”.
Jô morreu na madrugada desta sexta-feira, 5, aos 84 anos, em São Paulo. Ele estava internado no hospital Sírio Libanês desde o final de julho e a causa da morte não foi divulgada. Receber a notícia da perda do grande amigo não foi fácil para Nilton. “O Jô era uma pessoa extraordinária. Foi uma madrugada muito cruel para todos nós”, comentou. Ao longo da carreira, Nilton trabalhou em vários projetos com Jô e o humorístico “Família Trapo” foi um deles. “Conseguimos fazer uma caminhada muito bonita até que sofremos o primeiro grande incêndio da TV Record, antigo Cassino Colonial. Com isso, fomos para o Teatro Record”, relembrou o diretor. Foi nessa época que surgiu a vontade de fazer uma comédia de situação e Jô deu uma sugestão do que moldou o formato da atração “Família Trapo”, que ele escrevia em parceria com Carlos Alberto de Nóbrega. “Tinha um humor totalmente diferente, sem violência. O Jô fazia o mordomo da família, o Gordon.”
Nilton também relembrou a proximidade de Jô com Hebe Camargo, outro grande nome da TV brasileira. O diretor contou que o humorista participava como intérprete do programa dela quando tinha convidados internacionais. Um deles foi o médico Christiaan Neethling Barnard, que realizou o primeiro transplante de coração do mundo. “Foi um trabalho danado trazer ele da Cidade do Cabo, na África do Sul, para o programa e o Jô foi o intérprete. Ele foi um grande companheiro da Hebe”, pontuou Nilton. Além da carreira de humorista, roteirista e escritor, Jô também se destacou como apresentador e ficou no ar até 2016 com o talk show “Programa do Jô”, que era exibido nas noites da Globo. “Tenho certeza que quando ele foi afastado da televisão, ali começou uma nova etapa da vida do Jô. Não acho que tenha sido leal tudo o que aconteceu com ele. Merecia muito mais do que aconteceu com ele nos últimos anos. É uma tristeza, mas acho mesmo que o afastamento dele da televisão deu um certo desânimo, mas ele continuou vivo, fazendo seu teatro, escrevendo, dirigindo, botando grandes personagens no palco e fez isso com uma nobreza inacreditável”, destacou.
Nilton também esteve no Morning Show nessa sexta e voltou a comentar sobre a saída de Jô da TV: “Acho que o coração dele ficou muito triste quando ele foi afastado da televisão. Acho que tudo isso provocou um pouco de tristeza no interior dele”. Sem conter as lágrimas, ele acrescentou: “Tenho certeza, Jô, que logo, logo vamos nos encontrar na eternidade e vamos rememorar todas as nossas ‘molequices’. Como vou sentir saudades de você, gordo”. O amigo do humorista também ressaltou a relevância do trabalho que fez no teatro. “O Jô Soares no teatro era uma pessoa nobre, de um coração e de um profissionalismo inacreditável, era um gigante no palco e, agora, não temos mais esse gigante. As cortinas se fecharam, mas lá em cima alguém deve estar abrindo uma cortina para ele entrar”, concluiu. Em uma entrevista concedida ao Morning Show em 2017, Jô comentou sobre a saída da Globo: “Foi uma escolha de lado a lado, mas, de certa forma, com minha total aprovação, achei que estava mais do que na hora porque foram 15 mil entrevistas em 28 anos”. O apresentador declarou ainda que “não ia mais gravar com o mesmo prazer”, pois sentia que esse ciclo já tinha se encerrado.
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