Até a semana passada, a cidade registrou 5.629 casos de dengue. Em todo o ano passado, foram 11.910 casos, com duas mortes.
"A investigação epidemiológica avalia vários aspectos e situações envolvendo o caso clínico, como exames laboratoriais coletados e seus resultados, avaliações e relatórios clínicos, aspectos epidemiológicos e informação do atestado de óbito", diz a secretaria. Segundo a SMS, entrevistas com parentes e pessoas próximas fazem parte do processo de investigação, que inclui visita domiciliar feita pela unidade de vigilância em saúde.Após a avaliação de todas as informações, o caso é discutido com epidemiologistas da SMS e também da Secretaria de Estado da Saúde para esclarecer se a causa principal do óbito foi de fato a dengue ou se foram outras patologias ou condições clínicas do paciente.
Entretanto, infectologistas suspeitam que os números podem ser maiores por causa da forma como a diretriz é interpretada. Para o coordenador do Comitê de Arboviroses da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Kleber Luz, a causa do óbito é sempre o evento que leva à morte, o que desencadeia todo o processo que levará o indivíduo a morrer. "Por exemplo, um idoso de 98 anos é assaltado, empurrado e morre. Certamente, alguém de 98 anos tem várias comorbidades, mas, no caso, a causa da morte foi a violência. Mesmo que ele tenha diversas doenças, se não tivesse caído, o evento que desencadeou aquela norte não teria acontecido."
Segundo o médico, esta é a chamada causa básica, ou seja, mesmo que a pessoa tivesse comorbidades, estava bem até o evento. Então, no caso da dengue, no momento em que o indivíduo pega a doença, ela descompensa as outras comorbidades que também contribuem para a morte, mas a causa é a dengue. "Quem tem comorbidade sempre tem mais chance de morrer de uma infecção", explicou.
Para Kleber Luz, a interpretação dos casos pode gerar subnotificação das mortes por dengue. Ele enfatizou que o importante quando se comunica uma doença de notificação compulsória é que os dados servem para gerar ações de saúde pública e de controle. "Quando se notifica que 20 pessoas morreram de dengue, entende-se que é preciso matar o mosquito [Aedes aegypti], senão ninguém vai tomar atitude, porque sempre se encontrará uma justificativa para aquela morte."
De acordo com o pesquisador e diretor adjunto de Pós-Graduação da Faculdade de Medicina de Rio Preto, Maurício Lacerda Nogueira, o fato de os de casos de dengue aumentarem algumas regiões do estado e em outras, não, é um processo natural que segue o ritmo dos últimos 30 anos no país. Nogueira ressaltou que dengue é uma doença grave, que pode levar à morte. Por isso, regiões com experiência grande em dengue têm mortalidade menor do que outras, já que o preparo do sistema de saúde e o treinamento dos profissionais para atendimento da doença podem gerar significativa diminuição de mortalidade.
"Agora, qual é a diferença entre morrer com dengue e morrer de dengue? Morrer com dengue é você atravessar a rua e um caminhão te pegar, é uma morte não relacionada. Agora, se a pessoa tem uma comorbidade e tem distúrbios importantes causados pela dengue, morre com essa comorbidade, para mim, é morrer de dengue, sim, porque estava estável e a dengue tirou a estabilidade. É assim que acontece com covid e com influenza", ressaltou Lacerda.
Enfatizando que não conhece os casos, o pesquisador destaca que o registro de 100 casos de dengue com apenas duas mortes atribuídas à patologia não parece real. Para ele, pode haver uma interpretação mais liberal da doença. "Atribuir à comorbidade, sem entender o papel da dengue no desfecho, é estranho. E é correto dizer que essa interpretação pode levar a um registro menor de mortes pela doença. Nós, em São José do Rio Preto, utilizamos o mesmo protocolo do Ministério da Saúde, e os resultados são bem diferentes."
Kleber Luz lembrou que as ações contra o mosquito da dengue já são estabelecidas com o controle dos criadouros e das larvas, passando pela conscientização e educação da população, e com o uso do fumacê, em caso de muitos mosquitos e transmissão elevada da doença. "Por tradição, as ações são sempre insuficientes, porque a população quase nunca colabora na sua totalidade com o controle dos criadouros, jogando lixo, garrafas pet, pneus nas ruas, o que acumula muita água e favorece o crescimento das larvas."
Lacerda destacou que as ações são mas mesmas há 30 anos e que o problema só tem piorado, o que é uma prova de que o modelo que tem sido trabalhado é pouquíssimo eficiente e deixa a doença seguir seu ciclo biológico naturalmente. "O combate ao vetor centralizado já mostrou que é pouco eficiente. Estamos avançando rapidamente para novas estratégias em um futuro próximo, como vacina e combate à liberação de mosquitos, sejam transgênicos, ou com a bactéria que impede a transmissão, mas até lá eu não vejo essas estratégias", afirmou.
A prefeitura de São Paulo informou que, em 2023, até o momento, houve 1.523.914 ações de prevenção ao mosquito Aedes aegypti na cidade. Ao todo, foram 339.460 visitas, casa a casa; 13.798 vistorias em imóveis especiais e pontos estratégicos; 1.138.286 ações de bloqueio de criadouros e nebulizações, entre outras atividades específicas. No ano passado, as 28 unidades de vigilância em saúde fizeram cerca de 5 milhões de ações rotineiras de prevenção.
Em nota, a prefeitura diz que investe continuamente no Programa Municipal de Combate à Dengue e Demais Arboviroses. Em abril, começaram a ser instaladas na cidade 20 mil armadilhas de autodisseminação de larvicidas. "Os equipamentos são montados para que as fêmeas do Aedes aegypti, responsável pela disseminação da doença, após contato com o larvicida das armadilhas, distribuam o produto nos criadouros a fim de eliminar o mosquito ainda em estão larval, não permitindo que se desenvolva para a fase adulta", diz o texto.
Para a sazonalidade de 2023, a Secretaria Municipal de Saúde investiu também na ampliação da frota de veículos para transporte dos agentes de controle de endemias e na aquisição de mais 30 equipamentos de nebulização veicular, além de chamamento de concurso público para 703 novos servidores para a Rede Municipal de Vigilância em Saúde.
Em março, a prefeitura intensificou das ações de bloqueio ao mosquito nos distritos administrativos com maior número de casos da doença na última semana epidemiológica.
O estado de São Paulo fechou o ano de 2022 com 332.139 casos de dengue confirmados, distribuídos em 617 municípios, e 287 mortes. Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, São Paulo registra, neste ano, queda de 27% nos casos de dengue e de 37% nos óbitos, em comparação com o ano anterior. Foram notificados, até agora, no estado 25.157 casos e 94 óbitos pela doença. No mesmo período de 2022, 171.486 mil casos haviam sido registrados, com 150 óbitos.
Fonte: AgĂȘncia Brasil