Começamos este texto com uma frase que é de autoria de Tom Jobim. Ela foi extraída Do livro Inveja de Zuenir Ventura. Há uns tempos, não sei qual foi a editora que teve a ideia de publicar livros sobre cada um dos pecados capitais. Coube ao Zuenir escrever sobre a inveja. Vamos iniciar sobre a parte material do livro, que não me agradou. Capa e contracapa foram feitas em vermelho bem gritante e quem fez o projeto gráfico teve a infeliz ideia de colocar todos os dados do livro — orelha, editora, revisores, dados sobre o autor etc. — em letra azul marinho sobre o vermelho. Se você me perguntar o que está escrito ali, não temos como citar uma só palavra, porque azul sobre vermelho confundem -se e não é possível saber o que editora e autor pretendiam transmitir.
Bem, mas deixando de lado o aspecto material do livro, vamos ao contéudo que, felizmente seguiu o padrão convencional e colocou letras negras sobre a folha de papel branco.
Zuenir é um bom escritor carioca. Pena que, ao começar a escrever o livro ficou doente, o que comprometeu um pouco a pesquisa e deixou-o meio perdido em relação ao enredo, que acabou se transformando numa colcha de retalhos com uma historinha pra cá, outra pra lá. Mas, Zuenir é um bom escritor e, mesmo assim, o livro, apesar de não ser uma obra prima, distrai e mostra como a inveja destrói o mundo.
Quando o livro veio para em nossas mãos, no princípio não me agradou. Parei de ler para depois recomeçar e até que me distraiu nas horas vagas. Em mais de um ano de pesquisas, o autor ouviu psicanalistas, visitou terrenos de umbanda, conversou com padres. Baseando-me no prefaciador do livro, aconselho ao possível leitor que, antes começar a leitura, tenha em mente o seguinte: ciúme é querer manter o que se tem; cobiça é querer o que não se tem; inveja é não querer que o outro tenha.
Um personagem do livro, a emergente Vera Loyola, adverte:
"o verdadeiro amigo não é o que é solidário na desgraça, mas o que suporta o seu sucesso". E como disse outro consultado, um padre amigo do autor: "a solidariedade na alegria é muito rara." E o prefaciador do livro lembra oportunamente Nelson Rodrigues, quando diz: "há coisas que o sujeito não confessa nem ao padre, nem ao psicanalista, nem ao médium depois da morte." Uma delas é a Inveja.
Há muita frase, muito pensamento que poderíamos passar ao leitor, como um aperitivo para quem for ler o livro, como este trecho, por exemplo: "Em muitas culturas, o louvor é sempre recebido com reservas, porque se sente que funcione como mau agouro. No Brasil mesmo, quando algum maledicente resolve falar bem de alguém, pergunta-se com humor, pensando numa terceira pessoa: "Contra quem é o elogio?" É comum ouvirmos as pessoas dizerem: "Ninguém elogia com boas intenções." Claro que há uma certa má-fé em considerar todos os elogios invejosos. Há elogio sincero e bajulação suspeita. O problema é descobrir quando se é objeto de um ou de outro."
Numa ocasião, o autor discutiu com um amigo sobre as desigualdades sociais. O amigo defendeu a tese de que o ressentimento estava na origem das reivindicações e utopias igualitárias. Ele disse que o homem procura motivos de indignação para alimentar sua inveja. Inveja e má consciência são irmãs.
Poderíamos citar mais exemplos, mas fiquemos com este último parágrafo. O invejoso torce para que ao tirar sua ária no violino, arrebente uma das cordas. Ele é mesquinho, ele não suporta seu sucesso. Eu não quero que você tenha uma síncope, caia e morra. Eu quero seu fiasco. Quero que sua turma ria de você.
Taí. Pense bem em tudo que foi falado e analise-se. Você já teve inveja? Arrependeu-se? Livrou-se dela? Lembre-se: a inveja não goza de boa reputação.
Fique com este versinho de Millôr: "Pobre dos realizados;/ Não sabem o prazer profundo/ Que é ser feio e medíocre/ E invejar todo mundo."