Maria, Maria: A Força da Mulher que Sou

Por Jornal Cidade de Agudos em 12/03/2025 às 09:44:46

Hoje é dez de março, é a data já passou… eu sei!, apenas sei que as mulheres e sua luta não passam. O oito de março amanheceu em mim como um rito, uma lembrança e um chamado, mas travei não saiu uma letra sequer, fui transpassada por um leve ranço dos rituais perpétuos: flores, um bombom, milhares de mensagem virtuais bonitinhas, além claro, dos devastadores números da viol|violência contra nós - a cada 46 minutos uma mulher é estuprada, 21, 4 milhões de brasileiras sofreram algum tipo de violência grave em 2024. A jovem Vitória, morta após tortura, gruda nas minhas retinas e nem consigo chorar. Apenas lembrar de nossa fragorosa derrota como sociedade.

Bem, mesmo no meio de todos esses sentimentos, hoje segunda-feira, celebro quem sou, e todas as mulheres que vieram antes de mim. As mulheres que abriram portas, rasgaram véus e se ergueram diante do impossível. Vejo-as em minhas mãos, nas linhas do meu rosto, no jeito como aprendi a resistir sem perder a ternura. Caminho entre suas pegadas, mas não me prendo a elas. Avanço, danço, mudo o ritmo e traço meus próprios passos.

Nasço e renasço em cada amanhecer, revisito-me, desfaço malas, esvazio bolsos e descubro recomeços. O passado me compõe, mas não me define. Sei que o presente é solo fértil, terra que planto com intenção. Nem sempre floresce como espero, mas aprendi a respeitar os tempos de espera, as sementes dormentes. O futuro é um horizonte que me chama, mas caminho sem pressa, saboreando cada instante, cada descoberta de mim mesma.

Gosto da mulher que estou me tornando. Sei das minhas quedas, dos momentos em que duvidei da própria força, dos dias em que quis voltar atrás. Mas sei também da fibra que me ergue, do amor que me sustenta, da coragem que me habita mesmo quando tudo parece incerto. Sou feita de enfrentamentos e delicadezas, de medos e ousadias. Carrego em mim a força de tantas outras. De Carolina Maria de Jesus, que transformou dor em poesia, palavras em resistência. De Dandara, que lutou pela liberdade quando o mundo queria silenciá-la. De Maria da Penha, que fez de sua história um escudo para outras mulheres. Mas também das anônimas, que se levantam antes do sol, que criam filhos sozinhas, que enfrentam olhares duvidosos e ainda assim seguem firmes. Sou uma entre tantas, e nelas me reconheço.

A vida pulsa em mim, e eu a recebo inteira. Sou aprendiz do infinito, colecionadora de gatos pretos, flores e encantamentos. Quero os caminhos ainda não trilhados, os saberes que ainda não alcancei, os ventos que me movem para o novo. Mas sei que ser mulher vai além de uma data. Não sou um dia no calendário, sou constância, sou maré que não se prende à praia, sou raízes que atravessam o tempo e se renovam. Minha existência é resistência, celebração e movimento. Como na canção de Milton Nascimento, sou "uma certa magia, uma força que alerta, uma mulher que merece viver e amar como outra qualquer do planeta." Todos os dias sou, e todos os dias me torno.

Prazer, sou Vera Lúcia Ravagnani, eu conto histórias e ajudo pessoas a contarem suas próprias histórias em verso ou prosa por meio de cursos de escrita criativa e contoterapia.

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