Revendo notações antigas, detive-me um pouco mais nos pensamentos de Dalai-Lama. Quanta sabedoria quão pouco divulgadas essas ideias! A fim de dividir com o leitor um pouco de meus cadernos particulares, vou deixar um halo de perfume e de humanidade dessa figura singela, e, ao mesmo tempo, tão vigorosas. Vamos lá.
Hoje é possível sermos mais independentes dos outros do que em qualquer outra época. Porém, junto com o progresso surgiu a noção de que meu futuro não depende de meu vizinho e sim do meu emprego ou de meu patrão. Isso nos leva a supor que, pelo fato de os outros não serem importantes para a minha felicidade, a felicidade deles passa a não ser importante para mim.
Nossa ênfase excessiva ao ganho material reflete a suposição de que o que se pode comprar é capaz de proporcionar-nos a satisfação que esperamos. Entretanto, essa satisfação está limitada aos sentidos. Isso seria ótimo se fôssemos iguais aos animais. É óbvio que nossas necessidades transcendem ao que é sensual. A ansiedade, o estresse, a insegurança, a depressão que prevalecem entre aqueles cujas necessidades básicas foram satisfeitas são uma clara indicação desse fato. Uma revolução faz-se necessária. Não uma revolução política ou econômica, nem mesmo tecnológica. O que precisamos é de uma revolução espiritual.
Ao pregar uma revolução espiritual não estamos defendendo uma solução religiosa para nossos problemas. Claro que tais ensinamentos são proveitosos para a humanidade. Mas, mais importante que a crença religiosa é que você seja uma boa pessoa. Nós humanos conseguimos viver muito bem sem recorrer a uma fé religiosa. Vindas de uma personalidade religiosa isso pode parecer estranho. Mas, minha maneira de pensar foi moldada pela minha compreensão do que é ser um seguidor de Buda, mas existem princípios éticos universais que podem ajudar qualquer pessoa a alcançar a felicidade.
Creio que talvez se possa dispensar a religião, o que não se pode dispensar são as qualidades espirituais básicas: amor, compaixão, paciência, tolerância, perdão, contentamento, responsabilidade — que trazem felicidade para todos.
Meu apelo não é por uma revolução religiosa nem uma maneira de viver relacionada a outro mundo, muito menos a algo mágico ou misterioso. É um apelo para a adoção de uma conduta que reconheça os interesses dos outros paralelamente aos nossos.
As más notícias são um fato da vida. As de causas naturais — terremotos, enchentes, secas não são da responsabilidade humana. Mas, muitas são originadas pelo homem: corrupção, pobreza, trapaça, fraude, injustiça social, política, econômica, são consequências de um comportamento humano negativo. Não existe uma única classe que não contribua com sua dose diária de más notícias — da realeza aos presidentes, ministros políticos, cientistas, médicos, acadêmicos, estudantes, padres, freiras, industriais, artistas. Esses problemas podem ser superados por serem de natureza ética.
Qual a relação entre a prática da espiritualidade e a ética? Como o amor, a compaixão etc. pressupõem o bem-estar do outro, supõe também a contenção que a ética exige. E é possível estabelecer os princípios éticos controladores quando o ponto de partida for nosso desejo de felicidade. Precisamos, por exemplo, ser capazes de escolher entre o terrorismo como recurso para promover reformas políticas e os princípios de resistência política de Mahatma Gandhi. Uma revolução espiritual acarreta necessariamente uma revolução ética.
Até aqui, algumas noções de Dali-Lama. Que nossa inteligência seja capaz de discernir o básico dos ensinamentos dessa figura genial. Até a próxima.
Dra. Maria da Glória De Rosa
Pedagoga, Jornalista, Advogada
Profª. assistente doutora aposentada da UNESP